Serpente "Siantra".

Serpente "Siantra".

A serpente

“Ora ora, mais um novo viajante de além mar”, o taverneiro disse enquanto se aproximava da mesa onde eu estava. “Me chamo Tom e sou proprietário do Reduto de Siantra.” Tom disse isso olhando ao redor e com o peito levemente estufado e com orgulho de seu estabelecimento. Alguns meneios de cabeça em aprovação dos frequentadores da taverna em direção a mim e Tom.

O taverneiro acena para outro homem que parecia ser o garçom. “Então, pelo que vejo você veio de além mar em busca de riquezas, glória, renome ou o que quer que seja.” Em seguida o homem que Tom havia acenado traz uma caneca de cerveja e coloca a minha frente. “Por conta da casa, como sinal de boa vontade para um novo vizinho” Tom disse dando uma piscadela. “Como assim novo vizinho?” Eu disse olhando com certa apreensão para o taverneiro. Ele não estava totalmente errado, afinal, muitos dos que chegaram de além mar, como os moradores da cidade do porto se referiam aqueles que vinham de outros continentes, nunca voltavam para o seu local de origem ou os que tentavam retornar não se sabiam mais notícias. Algumas vezes, alguma embarcação destruída chegava à Baía de Melver e eram algumas das embarcações que tentavam retornar para seu antigo lar. Eu vim para ficar. Eu já estava há alguns dias na Cidade do Porto de Lexthorn. Havia chegado há pouco mais de um mês, mas cheguei por outro ponto da costa, em um local desabitado. Cheguei de uma maneira nada convencional, toda tripulação havia morrido e só eu fui poupado ou sobrevivi por sorte, mas essa é outra história.

“Você não está completamente errado e nem completamente certo, mas gostaria de saber sobre a região. Achei peculiar o ornamento talhado em volta da taverna. Uma serpente marinha.” Desta vez olhei incisivamente direto nos olhos de Tom qule entendeu exatamente o ponto onde eu queria chegar. Eu queria saber do que se tratava a história dessa serpente.

Por um breve momento o taverneiro se sentiu intimidado com o olhar. “Oras, Siantra a serpente marinha que reside no oceano ao nosso redor.” O entusiasmo logo tomou conta de Tom. “Siantra a deusa, ou deus, ninguém sabe ao certo. Quando os Gêmeos criaram tudo e também criaram essa entidade, disseram que ela veio viver em nosso mundo e ela mergulha em nossos oceanos desde então. Dizem que Siantra sabe de tudo que acontece nas costas e praias e que os braços de rios que chegam ao oceano também fazem parte de seu domínio”

Eu já sabia disso tudo, é uma lenda que se conta para nós desde criança. Eu não queria interromper Tom em toda sua empolgação. Queria que ele contasse algo que talvez pudesse ser diferente do que se é sabido sobre essa entidade. O último mês foi algo totalmente atípico para mim.

E Tom continuou. “... Cidade do Porto de Lexthorn é abençoada por Siantra, mesmo que as más línguas digam o contrário. O mar nunca se rebelou contra nós.” Tom mudou levemente o tom de voz e quase num sussurro quando disse “nós”. Foi aí que eu fiquei com mais dúvidas, Siantra é uma entidade conhecida por todos. Porém algumas coisas são muito mais diferentes do que imaginamos. Dizem que em alguns lugares os deuses têm maior presença e até agem mais entre os mortais e imortais se contarmos os elfos. Talvez nessa região do mundo as coisas sejam realmente muito diferentes.

“Sempre pensei que os deuses fossem mais observadores do que presentes; parece que Siantra é bem presente aqui na baía.” Disse eu para Tom.

Tom dá um leve sorriso como se estivesse gostando mais de nossa conversa. “Oh, sim. Somos agraciados e protegidos aqui. Sempre temos peixes e frutos do mar graças a ele... ela... é... não sei ao certo. Mas sim! Siantra sempre protegeu a Cidade do Porto.” Esta última frase Tom proferiu com vontade e um pouco mais alto como se estivesse reafirmando algo para si mesmo e também para quem pudesse ouvir.

Eis que no final da frase do taverneiro ouve-se alguém gritar de outro canto da taverna de Reduto de Siantra “Ah... aquela praga assassina!” Perplexo eu olho para Tom que parece já esperar que algo assim aconteça e não se abala.

“Bom, é isso meu nobre. Os deuses ajudam quem os ajuda, como dizem. Como se fosse um toma lá, dá cá.” Tom começa a se levantar da mesa. No mesmo instante também me levanto, enfio as mãos nas vestes e retiro um pequeno saco com moedas e deposito gentilmente na mesa. “Uma cortesia para alguém cortês que me presenteou com uma boa conversa.” Me viro e vou saindo da taverna quando ouço a voz de Tom, “Boa sorte! Você vai precisar. As portas do reduto sempre estarão abertas para você e viajantes de além mar.”

Com mais dúvidas do que respostas depois de estranhos acontecimentos que me fizeram chegar até a taverna Reduto de Siantra ainda acho que essa nova terra tem muito mais a mostrar do que imaginei quando sai em viagem, mesmo sendo muito diferente de onde venho. Um novo horizonte para ser desbravado e uma terra digna para ser uma Terra de Reis.


Posted on April 20, 2021 by Leandro Vieira